quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Gripe Suína na Liberdade

Foto: Edney Martins

Na noite da última sexta (21/08) fiz uma visita forçada à emergência do hospital Copa D'or, no Rio de Janeiro. Pesava sobre mim uma tonelada de dor, febre, incômodo, inflamação, a sensação de quase aquela música inteira de enfermidades cantada pelos Titãs, e, claro, o "pânico" da vez: a possibilidade de ter a tal PANDEMIA SUÍNA anunciada.

É bom que se esclareça que sou dos que acreditam que as providências estão sendo tomadas e que esse negócio de pandemia é um grande exageiro, mas depois que o Jornal Nacional iniciou com o William Bonner dizendo diretamente para mim - foi para mim, não foi? - que mais quatro pessoas haviam morrido da tal gripe naquele dia, achei por bem acionar minha categoria de cidadão e ligar para o Disk Gripe (certamente primo dos
trocentos "Disques" que nasceram nessa modernidade), e iniciar a conversa que se concluiu com a indicação para buscar um hospital, diante de minhas respostas positivas a todas as perguntas do protocolo montado pelo Ministério da Saúde.
Justificar
Como todo bom exemplar do gênero masculino, pensei: estarei eu caminhando para o meu fim? E seria ele assim suíno por meu signo chinês ser Javali, que sempre foi um porco disfarçado? E com essa profundidade de reflexão, que bem podia ser fruto da febre que já ia nas alturas, fui com minha identidade impressa e o cartão do plano de saúde nas mãos, e debaixo de uma chuva cão que resolveu cair na cidade. Já na emergência do hospital, a espera pouca no atendimento não me permitiu fazer contato mais próximo que o simples boa noite com os demais que lá estavam àquela altura, e isso ficou totalmente impossível após meu retorno do primeiro atendimento, já com a máscara que o enfermeiro me enfiou na cara após medir pressão, temperatura, e colocar também nele a máscara que lhe garantia a segurança (devo dizer que é impressionante a clareira que fica em torno de uma pessoa com máscara; segundo um colega, ela é muito útil como ferramenta para conseguir lugar para sentar nos transportes públicos). Absorto naquela solidão que o preconceito me causou, vi o Bonner dizendo o clássico boa noite e pensei: para ti talvez, meu caro, mas aqui parece que a coisa vai loooonge.

Dois vidrinhos de sangue depois, retirados para os exames que o médico (de máscaras e mãos bem lavadas) pediu, fui vendo na TV da sala de espera as aventuras de Opash entre
are babas, tics, mamadis e todo esse mundo de palavras e entusiasmadas quebradinhas de pescoço indianas da novela de Glória Perez. Ali, sozinho e com a clareira em volta de mim, comecei a pensar no monte de coisas que tinha para fazer e nos e-mails que recebi, e lembrei que entre eles tinha um que trazia a história de uma pessoa que respeito muito, o jornalista paraense Lúcio Flávio Pinto. Para quem ainda não o conhece, está aí um bom momento de encontro com o que há de cidadania em todos nós.

Lúcio é um JORNALISTA, assim mesmo, com todas as letras maiúsculas. Aluno que fui do NPI, a escola de aplicação da Universidade Federal do Pará, tive a sorte de participar de um encontro com ele na escola, onde ele falou sobre eclusas (já ouviu falar disso?) com uma didática impressionante, a ponto de dar a mim e a todos os que ali estavam, a dimensão do que é Amazônia, do nosso espaço, sem que saíssemos daquele auditório. Um cara fantástico, coerente com suas opiniões e editor do Jornal Pessoal, um jornal que, de tão essencial, não pode ser chamado de alternativo. Ele é sim fundamental a uma sociedade que busque a reflexão para o seu entendimento, a compreensão do passado, esse insumo fundamental para o encontro e a conversa que vise uma construção conjunta e justa de futuro.

Fui pensando isso entre tosse, febre alta (seria por isso?) e uma ida a radiografia que o Dr. Pedro solicitou em meu prontuário. Curioso como ali naquela nova cidade eu me via lembrando da minha cidade natal e tinha a história de Lúcio como meu elemento de ligação, mas o fato de que uma pessoa como essa estivesse vivendo um dos casos mais Kafkianos da imprensa nacional era fermento desse pensar. Lúcio foi condenado por um juiz de Belém a indenizar dois empresários proprietários do maior grupo de comunicação do Norte do Brasil, o grupo "O Liberal", e a sentença - se é que aquilo assim pode ser chamado - deveria ser utilizada nos inúmeros cursos de magistratura para ensinar como NÃO ser um magistrado, como macular uma carreira, se é que esse senhor pretendeu de fato formar uma algum dia.

A condenação de Lúcio Flávio e o seu aprisionamento na cidade de Belém em razão das dezenas de ações movidas contra ele pelos proprietários do "O Liberal" é um acinte não a uma cidade, mas a princípios básicos de cada um de nós, sejamos moradores de Belém, do Rio, de São Paulo, do Chuí, do Oiapoque, de todos os cantos onde as palavras democracia e liberdade façam algum sentido. Não estou falando de um jornalista que trata a notícia de maneira cretina, falo de um profissional que é base de estudo de qualquer trabalho sério sobre a Amazônia, seja no seu âmbito econômico, social, cultural, ambiental, humano ou político, e o seu caso, que já é de domínio de todos de lá e de além mar, mostra o quanto o Pará se encontra hoje em um momento de pior nível de capital social. A perseguição a Lúcio expõe uma sociedade e a reação a ela demonstra que ainda há muito o que fazer, porque cercear isso é permitir que exista uma única verdade, um único olhar, uma opinião que não traz em si a isenção de conceder a uma sociedade um amplo grau de informação, e isso asfixia, seca, mata muito mais do que palavras; vai no campo fértil dos sonhos e atinge de maneira mortal o sentido da liberdade.

Ali, naquele hospital em noite de sexta chuvosa em Copacabana, entre máscara, agulhas, radiografias,
are babas e tudo o mais, rezei. Rezei por Lúcio, por Belém, por meus filhos, por todos os que antes de nós aqui estiveram, por todos os que aqui pereceram em nome da verdade, da liberdade e da justiça, essa que não é do juiz Raimundo das Chagas, posto que não a compreende. Rezei para que mais pessoas soubessem disso e para que não ouvisse o Bonner dizendo qualquer dia desses: "Mais um caso de assassinato da liberdade no Pará".

Que a gripe suína do absurdo passe longe de nossas aldeias, de nossos lares, de nosso caminhar. Toda minha solidariedade a Lúcio e ao que ele representa.

Para quem quiser saber mais, aí vai o blog: http://solidariedadelucioflaviopinto.blogspot.com

By the way, não estou com gripe suína.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Da lavra de Marina, da Silva, do Mundo, do Meio e do Ambiente

Inverno no Arpoador (Foto: Edney Martins)

"Tenho certeza de que enfrentarei muitas dificuldades, mas a busca do novo, mesmo quando cercada de cuidados para não desconstituir os avanços a duras penas alcançados, nunca é isenta de riscos."
(Trecho da carta encaminhada pela senadora Marina Silva ao presidente do Partido dos Trabalhadores, onde comunicava sua decisão de deixar o partido)

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

A lâmina da palavra


"Tua ida para 'Shangrilá' deveria ser para melhorar tua vida, mas, pelo visto...". As palavras saltaram do telefone e o pegaram desprevenido, só sentiu o frio no estômago e uma dor fina na trajetória imaginária que aquela suposta bala (perdida?) fez no seu corpo. Ele se deu conta de que a vida fez com que ela esquecesse como suas palavras sempre lhe deram alento nos momentos complicados, esses que normalmente se apresentam diante das principais encruzilhadas da vida. Os tempos eram outros, a trilha diferente e o sonho que o guiou foi o antônimo da praticidade que a formou, como acontece em famílias e relações diversas, sejam elas boas ou não.

O poder da palavra pode calar como cala um soco no estômago, ainda mais em dias de festa. Essa arma mal empregada pode condenar inocentes ou salvar pessoas vis, cria o improvável, estabelece realidades e faz estremecer princípios, e o mais interessante é que não são todos os que carregam essa consciência, por isso, às vezes sem saber, sem a consciência que possuem em outros momentos, retalham a realidade na frente de quem já está de joelhos diante dela e da impossibilidade de sua alteração.

Os sonhos, esses grandes padrinhos dos navegadores, aqueles que, como lembrou Pessoa, tiveram a coragem de ir "além do Bojador" na construção de novas realidades, têm uma relação direta com a criança que mora dentro de cada um; ela é a responsável por assoprar a brasa da fogueira da possibilidade, de espantar para longe as nuvens que teimam em esconder o sol quando ele é tão necessário, de saltar no mar sentindo o frescor do novo, da nova água - sempre em movimento - do sal da vida. É no coração dessa criança a sua morada, e é a condução dessa vida que fará com que o nascer do sol tenha visões distintas, valores diversos, permissões expandidas ou não.

Para ele, a dor daquele momento era a dor do crescimento, de sentir e ver o adulto ali, tomando conta e se apresentando a partir da realidade e da necessidade que se apresentou. Sonhar realmente custa assim tão caro? O quão caro é o sonho de cada um? Quão distante é a estrada que nos separa disso? Qual o tamanho de nossa incompreensão de fato e quanto podemos colocar o dedo na ferida daqueles que ainda não conseguiram o que achamos 'adequado'? Essas são questões da modernidade ou da humanidade? De agora ou de sempre? Não importa! O que importa é que devemos nos dar conta da força das palavras e da diversidade que temos no mundo. O que é bom para mim, pode não ser para o outro; o que é sonho para o outro, pode ser uma grande bobagem para mim, mas isso não autoriza o não cuidado, a palavra seca, a dor provocada, mesmo que sem intenção. A vida passa e faz com que fiquemos, de maneira e intensidade diversas, diferentes na praticidade com que a levamos, e isso não permite que abandonemos a tolerência para fazer com a nossa terra uma lama da água turva de um.

No momento de angústia, estender as mãos a alguém que discordamos é um ato de humanidade, a mesma que nos gerou e que ajudamos a construir. A mesma santificada em oração:

Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz.
Onde houver ódio, que eu leve o amor,
Onde houver ofensa , que eu leve o perdão,
Onde houver discórdia, que eu leve a união,
Onde houver dúvida, que eu leve a fé,
Onde houver erro, que eu leve a verdade,
Onde houver desespero, que eu leve a esperança,
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria,
Onde houver trevas, que eu leve a luz.

Ó Mestre, fazei que eu procure mais
consolar que ser consolado;
compreender que ser compreendido,
amar, que ser amado.
Pois é dando que se recebe
é perdoando que se é perdoado
e é morrendo que se nasce para a vida eterna...

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Poesia do Encontro

Martha Medeiros com os alunos da Casa Poema (Foto: Edney Martins)

No último sábado, dia 01 de agosto, aconteceu o primeiro "Poesia do Encontro" na Casa Poema (www.casapoema.com.br), espaço cultural criado pela atriz e poeta Elisa Lucinda, no Rio de Janeiro. Dizer que foi uma tarde poética seria redundante, já que o nome da casa já anuncia essa possibilidade, mas assim ela foi, uma tarde única, especial e emocionante no momento em que os alunos da Escola Lucinda de Poesia Viva - que tem sua sede naquele espaço cultural - brindaram os presentes com as poesias de Martha Medeiros sendo ditas com a coloquialidade que lhes atribuiu a vida com que foram pousadas no papel.

Foi na segunda parte do encontro, quando Martha e Elisa conversaram entre si e com a platéia lotada e ainda mais bela com a presença de Beth Carvalho e Regina Duarte na primeira fila, que a emoção tomou conta de todos. Martha disse como estava feliz com aquele dia e com o trabalho mostrado pelos alunos, e que se sentia inspirada a escrever mais poesias, prometendo que o lançamento de seu próximo livro, no ano que vem, será na Casa Poema.

Ali, naquela tarde que seguiu com a sessão de autógrafos da convidada, a Casa Poema demonstra que o espaço da poesia, da escrita, da palavra, do encontro do autor/escritor/poeta com o público, aquele que o lê e que o tem em sua imaginação, está garantido e pode ser sim novidade, alento e alegria, um belo encontro de tarde entre amigos que há muito não se veem...e ouvem, um belo momento de mostrar que a poesia está muito viva e reunindo vários em torno dela, e a casa lotada disse isso.

Programado para acontecer mensalmente, a tarde de sábado deixou gostinho de quero mais, de brigadeiro no aniversário de infância e todos já estão animados para setembro, quando Ferreira Gullar trará seu açúcar, seu rosto, seu olhar, seu sorriso, sua poesia e toda a beleza da junção de suas palavras para a Casa Poema.

Eu não vou perder e estarei lá. Se não conseguires ir, depois te conto aqui.

Ah! Para quem quiser ler as impressões de Martha Medeiros sobre o evento, vale uma visita no site dela. O endereço? Aí vai: www.clicrbs.com.br/marthamedeiros